Caixa do mês

Caixa de abril

abril 2024

A caixa do mês inclui o livro Cancioneiro geral [1962-2023], de José Carlos Capinan, que reúne, pela primeira vez, os livros de poesia, poemas esparsos e uma ampla seleção das letras que o baiano José Carlos Capinan. Poeta, letrista e ícone da Tropicália, Capinan fez canções em parceria com Caetano Veloso, Edu Lobo, Fagner, Gilberto Gil, Jards Macalé e Paulinho da Viola, cantadas por Gal Costa, Elis Regina, João Bosco e Maria Bethânia, além, é claro, de outros milhões de brasileiros que têm sido embalados por seus versos em mais de sessenta anos de militância artística.

Além do livro, também acompanha na caixinha a plaquete cova profunda é a boca das mulheres estranhas, que apresenta trabalhos inéditos da premiada poeta gaúcha Mar Becker. Nela, Becker abre seus versos para a vingança das “mulheres estranhas”, silenciadas e deformadas pelas imposições de uma sociedade que as constrange a uma vida de medo, dor — e ódio.

Livro de abril

Grande parte de nossa melhor poesia chega ao público pelas ondas do rádio. Do samba ao rap, da bossa nova aos vários ramos e gerações da mpb, temos chamado de letristas alguns dos grandes poetas da língua portuguesa, que muitas vezes não chegam a reunir suas palavras em livros. Nessa longa tradição, o nome de José Carlos Capinan — ou simplesmente Capinan — é uma presença das mais significativas.

Desde os anos da Tropicália, seus versos são musicados por parceiros como Edu Lobo, Fagner, Gilberto Gil, Jards Macalé e Paulinho da Viola, cantados por vozes como as de Gal Costa, Caetano Veloso, Elis Regina, João Bosco e Maria Bethânia, regravados por gerações de artistas e, acima de tudo, cantarolados por milhões de ouvintes, que talvez não saibam que devem ao poeta baiano as letras de “Soy loco por ti, América” ou “Papel machê”, entre centenas de outros grandes sucessos que sabemos de cor.

Em paralelo às parcerias musicais, Capinan também esteve sintonizado com outros caminhos da poesia de sua época, tendo publicado diversos livros em que sua rara e combativa sensibilidade social se expressa tão intensamente quanto nos discos. Como afirma Maria Bethânia, na orelha desta edição, “Capinan escrevendo é lírico, político, guerreiro, autor raro, brilhante, vivendo na carne cada verso, cada rima, cada expressão”. 

Cancioneiro geral [1962-2023], organizado por Claudio Leal e Leonardo Gandolfi, abarca mais de sessenta anos de trabalho artístico de Capinan, reunindo todos os seus livros de poesia, além de poemas esparsos e uma vasta seleção das canções escritas pelo poeta entre 1965 e 2023, seguidos de um posfácio do jornalista Claudio Leal e textos críticos assinados por José Guilherme Merquior, Ênio Silveira, Gilberto Gil e Luiz Carlos Maciel.

Plaquete de abril

Autor

Mar Becker

Poucos poetas das novas gerações despertaram tanto fervor quanto a jovem gaúcha Mar Becker. A afirmação pode soar pesada demais para quem a conhece agora, mas, desde os primeiros poemas publicados em redes sociais, Mar Becker se celebrizou pela forma que conduz os leitores para atmosferas familiares, domésticas e íntimas que, na teia dos versos, logo se revelam vertiginosamente estranhas e violentas.

Tal fervor se confirmou no sucesso de crítica e público em torno de seu primeiro livro, A mulher submersa (Urutau, 2020), finalista do prêmio Jabuti e vencedor do prêmio Minuano, concedido pelo Estado do Rio Grande do Sul. Desde então, a poesia de Becker tem despertado cada vez mais interesse, o que levou à publicação em Portugal de Canção derruída (2023) pela prestigiosa Assírio & Alvim.

Nos poemas de cova profunda é a boca das mulheres estranhas, Becker nos arrasta para um terreno movediço, descortinado por versos que incorporam os gestos contidos e tensos com que a mãe, a irmã e as donas de casa que povoam sua Passo Fundo natal — em que se espelham todas as “mulheres estranhas” de tantas outras cidades — desafiam o silêncio brutal que as cerca e invade.

Desde o título, a autora subverte os moldes religiosos em que a vida das mulheres tem sido forçada a caber por séculos e séculos. Nos versos, sob a gagueira e o medo, a timidez e o desajeito, é gestada uma espécie de sublevação, de vingança, que apenas a poesia, “inconsagrada hóstia”, sabe captar com perfeição.