Caixa de dezembro
Na caixa de dezembro, os assinantes recebem Poesia completa, de Gilka Machado. Nome fundamental da poesia brasileira de todos os tempos, a poeta formou-se entre a influência parnasiana e simbolista e a efervescência modernista do início do século xx e, desde cedo, conquistou prêmios com seus versos admiráveis. Apesar do aplauso de críticos, leitores e de seus pares mais ilustres, o erotismo e a liberdade feminista de sua obra sempre foram motivo para difamações. Nada foi, no entanto, e nem será capaz de abafar a voz revolucionária que ressoa nessas páginas. O livro é acompanhado por O salto do tigre, de Isabela Benassi, nascida quase um século depois de Gilka Machado, e que também está entre as poetas “que aceitam sujar as mãos/ com os problemas do seu tempo”. Nas páginas dessa plaquete, as palavras de Benassi se conectam às esperanças e lutas de mulheres e homens que fizeram “um pacto/ de colheita/ pelo futuro”, revelando um olhar que nunca evita embates — do machismo à luta de classes, da destruição ambiental ao colonialismo, do luto à desigualdade social —, mas é sempre muito hábil em nos lembrar que há formas de vida e de luta mais bonitas, inteligentes, precisas. Como um tigre sabe, como um tigre salta.
Livro de dezembro
Autor
Gilka Machado
O nome de Gilka Machado vem recebendo merecido destaque na lista dos nossos — não apenas das nossas — grandes poetas de todos os tempos. Nascida no final do século xix, Machado estreou muito jovem, entre a influência parnasiana e simbolista e a efervescência modernista, mas trouxe desde o início marcas pessoais muito fortes para o cenário da poesia. Sua paixão pelos prazeres da existência é inconfundível. Já em seu primeiro livro, no poema “Sândalo”, o perfume é a “volúpia da terra”: “Odor que o sangue inflama e que um desejo imenso/ de prazeres sensuais em nossas almas ferra”.
Ainda adolescente, Gilka Machado conquistou prêmios com seus versos, mas, se o apuro técnico justificou o reconhecimento de críticos e de seus pares mais ilustres (de Olavo Bilac a Mário de Andrade e Drummond), o erotismo e a liberdade feminista de sua obra sempre foram motivo para difamações no meio intelectual. Não foram poucos os que a atacaram, mas isso não impediu que os leitores e leitoras aplaudissem seu talento.
Em nota autobiográfica escrita em 1978, a poeta afirmou: “Sonhei ser útil à humanidade. Não consegui, mas fiz versos. Estou convicta de que a poesia é tão indispensável à existência como a água, o ar, a luz, a crença, o pão e o amor”. Sem dúvida, a poesia de Gilka Machado — livre, revolucionária, brilhante — é indispensável.
Poesia completa reúne integralmente os livros Cristais partidos (1915), Estados de alma (1917), Mulher nua (1922), Meu glorioso pecado (1928), Sublimação (1938) e Velha poesia (1965), com texto fixado a partir da última edição cuidada pela autora. O volume traz ainda um posfácio escrito pela organizadora, a jornalista Jamyle Rkain; um ensaio de Nádia Battella Gotlib, professora aposentada da Universidade de São Paulo (usp); e um depoimento concedido pela poeta em 1979, a Nádia Battella Gotlib e Ilma Ribeiro.
Plaquete de dezembro
Autor
Isabela Benassi
Não resta dúvida de que Isabela Benassi, poeta e pesquisadora que estreia com O salto do tigre, está entre aquelas e aqueles “que aceitam sujar as mãos/ com os problemas do seu tempo”. Suas palavras se conectam às esperanças e lutas de mulheres e homens que fizeram “um pacto/ de colheita/ pelo futuro”. E tomam posição franca: “sonho com a revolta de/ meus pares/ (sonhar não me satisfaz)”.
Se um dos aspectos mais admiráveis da poesia contemporânea é a diversidade de formas encontradas pelos poetas para falarem de política (num arco amplo que vai do depoimento sobre a experiência subjetiva até o discurso abertamente engajado), os poemas de Benassi são a expressão de uma maturidade nessa tarefa coletiva de flagrar e afrontar as fraturas do tempo presente. Sob minuciosa camada lírica, seus versos acusam a conflituosidade tão variada em que estamos imersos, afundando, sufocando.
Quando estica a voz em direção a Leonardo Fróes ou ao pai, a Maradona ou a Orides Fontela, ou imagina encontrar Walter Benjamin como um judeu “vivo e contemporâneo” nas ruas do bairro do Bom Retiro, em São Paulo, a poeta de O salto do tigre se nutre de força e delicadeza para enfrentar esse mundo em que “os que escrevem/ apanham a caneta pela mão e/ apanham/ apanham/ apanham”. Seu olhar nunca evita embates — do machismo à luta de classes, da destruição ambiental ao colonialismo, do luto à desigualdade social —, mas é sempre muito hábil em nos lembrar que há formas de vida e de luta mais bonitas, inteligentes, precisas. Como um tigre sabe, como um tigre salta.