O clarão das frestas
(dezembro 2024)
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Sobre a plaquete
Haicai, haikai, haiku: a veneração pelos pequenos e inesgotáveis poemas da tradição japonesa — três versos que captam a beleza fugaz da vida, com imenso poder de sugestão e de reinvenção do nosso olhar — atravessa os séculos e as culturas desde que um poeta chamado Matsuo Bashô (1644-1694), um monge sem mosteiro e samurai sem espada, cruzou o Japão com seu pincel e, por onde passou, soube demonstrar que tudo que existe à nossa volta é extraordinário: o salto de uma rã, um melão na lama, a lágrima do peixe.
Nas páginas do ensaio O clarão das frestas, o poeta, ensaísta e editor Felipe Moreno sai à rua para caçar haicais (“sutilíssimo espanto diante de todo e qualquer fenômeno — com preferência aos diminutos e corriqueiros”) e encontra um mundo em que, soterrada pela brutalidade de uma forma de vida que espalha destruição, a poesia vibra nas coisas mais banais e ensina a ver tudo ao nosso redor com uma nova sensibilidade.
Diante de seu olhar agudo, as conexões mais inusitadas surgem. É assim que ele percebe a natureza resistindo: “Frio, já é noite. Ando e ninguém me vê. Calçada saliente: adoro quando as raízes de velhas árvores levantam o asfalto”. Até mesmo ao comer uma singela paçoca a vida pode surpreender: “Nenhum devaneio encantado ou assombro metafísico pode me arrancar do momento em que saboreio uma paçoca. Quando o perfeito casamento entre o amendoim torrado, o açúcar e a pitada de sal toca o paladar, toda verborragia mental é ceifada pela raiz. Aqui, eu e a paçoca somos um”.
Enquanto caminha ou pedala, Felipe Moreno consegue fazer sua trilha se encontrar com a dos grandes haicaístas, sempre conscientes de que, ao desejarmos transformar a vida em poesia, dois caminhos se misturam diante de nós: aquilo que vivemos quer se tornar poema, mas também o que sonhamos quer se concretizar na vida.
Esta plaquete é parte da caixa de dezembro 2024
- título O clarão das frestas
- autor Felipe Moreno
- Páginas 40
- ISBN 978-65-6139-015-6
- Formato 13,5 x 20
Trecho
“De origem japonesa e influência zen, haicai é a poesia de três versos que, há mais de cem anos, aportou no Brasil e, de lá para cá, prolifera-se, transforma-se. Seu sentido de ser, no entanto, segue intocável: haicai é o sutilíssimo espanto diante de todo e qualquer fenômeno — com preferência aos diminutos e corriqueiros. Haicai: pedrisco que brilha, centelha, chispa. Encontrá-lo na sordidez do meio-fio urbano não é, exatamente, subverter sua tradição bucólica, mas expandir seu escopo, adicionar mais ingredientes, misturar sabores. Pois não importa se ambientado na floresta ou no asfalto, haicai é suspiro de uma experiência de assombro, escrita do olhar que sempre vê pela primeira vez, mínimo encanto encapsulado.”