cova profunda é a boca das mulheres estranhas
(abril 2024)
Sobre a plaquete
Poucos poetas das novas gerações despertaram tanto fervor quanto a jovem gaúcha Mar Becker. A afirmação pode soar pesada demais para quem a conhece agora, mas, desde os primeiros poemas publicados em redes sociais, Mar Becker se celebrizou pela forma que conduz os leitores para atmosferas familiares, domésticas e íntimas que, na teia dos versos, logo se revelam vertiginosamente estranhas e violentas.
Tal fervor se confirmou no sucesso de crítica e público em torno de seu primeiro livro, A mulher submersa (Urutau, 2020), finalista do prêmio Jabuti e vencedor do prêmio Minuano, concedido pelo Estado do Rio Grande do Sul. Desde então, a poesia de Becker tem despertado cada vez mais interesse, o que levou à publicação em Portugal de Canção derruída (2023) pela prestigiosa Assírio & Alvim.
Nos poemas de cova profunda é a boca das mulheres estranhas, Becker nos arrasta para um terreno movediço, descortinado por versos que incorporam os gestos contidos e tensos com que a mãe, a irmã e as donas de casa que povoam sua Passo Fundo natal — em que se espelham todas as “mulheres estranhas” de tantas outras cidades — desafiam o silêncio brutal que as cerca e invade.
Desde o título, a autora subverte os moldes religiosos em que a vida das mulheres tem sido forçada a caber por séculos e séculos. Nos versos, sob a gagueira e o medo, a timidez e o desajeito, é gestada uma espécie de sublevação, de vingança, que apenas a poesia, “inconsagrada hóstia”, sabe captar com perfeição.
Esta plaquete é parte da caixa de abril 2024
- título cova profunda é a boca das mulheres estranhas
- autor Mar Becker
- FORMATO 13,5 x 20 CM
- ISBN 9786584574656
Trecho
Um curso em vermelho (excerto)
enquanto passa a camisa, lia compreende a
suavidade do pano, o modo como nele o caimento
desenha
um corpo, reconhece, lia
alcança com os dedos a confissão ainda viva do
linho, adivinha a estatura dos ombros, chega a
vislumbrar linhas de ossos e de músculos, a correnteza
do sangue, a jugular, através
do branco prevê um curso em vermelho
e sim saberia que lugar do pescoço apertar para alongar
o prazer
se quisesse, e claro
também — não que precise mas
que golpe a seco desferir para que pareça acidental